O Mistério dos Príncipes da Torre de Londres
Não apenas pessoas (ou personagens) é que fazem parte dos mistérios da história. Os locais também constituem mistérios em si. Principalmente em continentes como a Europa, com construções antigas que transpiram os fatos que lá aconteceram e fascinam pelos seus segredos impenetráveis.
Um dos lugares mais históricos de Londres e que atrai uma infinidade de turistas todos os anos a Torre de Londres, local intimamente ligado à história da Inglaterra e de seus governantes. Não é por acaso que também é conhecido como um dos lugares mais sanguinários de toda a Europa, com histórias de decapitações e fantasmas que abundam nos relatos dos guardas de lá para o público.
Independentemente de os espectros existirem ou não, o fato é que muitas dessas histórias são baseadas em fatos historicamente comprovados. Uma das mais fascinantes envolve o material que gerou uma das peças mais fascinantes de Shakespeare, Ricardo III.
O rei Ricardo (1452-1485) foi o último monarca da casa de York e reinou entre os anos de 1483 e 1485. Era o irmão mais novo do rei Eduardo IV e de George, duque de Clarence. Sua subida ao trono foi marcada pelo completo desaparecimento de seus sobrinhos, que teriam sido vistos com vida pela última vez na Torre de Londres.
Ricardo era um soldado leal e jurou fidelidade ao Príncipe de Gales. A Guerra das Rosas entre as casas de York e Lancaster já durava trinta anos. Eduardo IV morrera repentinamente em 1483, logo após seu 41o aniversário. Seu filho mais velho e herdeiro do trono tinha apenas 12 anos e, no testamento, o falecido monarca nomeara Ricardo, duque de Gloucester, como protetor do reino. O jovem Eduardo era, na época, o Príncipe de Gales, título que o herdeiro imediato ao trono do Reino Unido carrega até hoje.
Apesar de ter jurado lealdade para com o jovem sobrinho, Ricardo agiu rapidamente após a morte do irmão. Interceptou a comitiva que acompanhava o príncipe, prendeu o tio materno (que era regente interino) e foi com o sobrinho para Londres. A coroação foi adiada e o menino foi instalado na Torre de Londres.
Desconfiada, a viúva de Eduardo IV, Elizabeth Woodville, buscou abrigo na Abadia de Westminster juntamente com seu filho mais novo, também chamado Ricardo. Porém o poder do usurpador foi mais forte e ele conseguiu que ela lhe entregasse também o jovem Ricardo, de apenas nove anos, com o pretexto de que Eduardo estava muito sozinho na Torre de Londres e precisava de alguém para brincar.
Depois disso, o golpe fatal foi dado por Ricardo no dia da coroação do sobrinho. Do lado de fora da Catedral de São Paulo, como afirmou o doutor em Teologia de Cambridge, Ralph Shaa, Eduardo IV tinha uma união inválida com Elizabeth e que os filhos de ambos, inclusive o menino-rei, seriam considerados ilegítimos. Depois disso, Ricardo aceitou a coroa dois dias após o começo dessas pregações, tornando-se assim Ricardo III.
Depois dessa confusão, o jovem Eduardo, agora chamado pejorativamente de Eduardo, o Bastardo, e seu irmão foram vistos brincando várias vezes na Torre. Uma testemunha deixou um registro que afirma que os dois meninos foram mais tarde transferidos para quartos isolados e começaram a aparecer cada vez menos até que sumiram sem deixar rastros.
Em 1483, começaram os rumores de que os dois príncipes teriam sido assassinados. Porém ninguém sabia dizer por quem. Em 1484, o chanceler francês lançava um aviso sobre o perigo de se ter um rei menor de idade e que os meninos haviam sido assassinados pelo tio.
Elizabeth estabeleceu uma aliança com os inimigos de Ricardo ao oferecer sua filha mais velha à casa de Lancaster, na pessoa de Henrique Tudor. No ano seguinte, Henrique e Ricardo se enfrentaram na Batalha de Bosworth Field e Ricardo foi morto. Seu reinado terminara abruptamente. Um dos homens de Ricardo, que passara para o lado dos Lancaster no meio da batalha, tirou a coroa do rei morto e a colocou na cabeça de Henrique, que se tornou Henrique VII.
Mais tarde, Henrique ouviria boatos de que os príncipes estariam ainda vivos e que seriam seus rivais para o trono. Fora ele, porém, quem espalhara a versão de que os meninos tinham sido asfixiados com colchões de penas e sepultados debaixo das pedras da base de uma escada da Torre. A maneira que ele encontrou para provar sua história foi acusar um tal de Sir James Tyrell de “traição não específica”. Esse pobre coitado teria, antes de ser decapitado em 1502, confessado que fora ele quem matara os príncipes. A história foi aceita dessa maneira e entrou para os anais britânicos.
Cerca de 200 anos depois, em 1674, foi encontrado na Torre, durante obras de restauração, um caixão de madeira com os esqueletos de duas crianças. Foram então reconhecidos como sendo os restos dos príncipes desaparecidos. Terminaram sendo sepultados na Abadia de Westminster. Apenas em 1993 os restos foram entregues aos peritos forenses, que não conseguiram determinar a causa da morte, pois o maxilar do mais velho estava muito deteriorado. Até hoje não se sabe bem o que aconteceu para os garotos terem desaparecido dessa maneira nem como duas crianças tão conhecidas pelo público teriam mortes tão terríveis. Se foram mortos a golpes, facadas, envenenados ou qualquer outro tipo de execução, jamais saberemos a verdade. Se a morte foi ou não causada por Ricardo III, tampouco. Enquanto isso, os turistas se divertem com os relatos dos fantasmas dos príncipes que, segundos os guardas do local, aparecem por lá regularmente.